quinta-feira, 7 de junho de 2012

Cúpula dos Povos por justiça social e ambiental, contra a mercantilização da vida e da natureza em defesa dos bens comuns


Por ascom_mdc 

Opinião: Cúpula dos Povos por justiça social e ambiental, contra a mercantilização da vida e da natureza em defesa dos bens comuns

Por Ivo Lesbaupin, da direção executiva da Abong

De 15 a 23 de junho, o Rio de Janeiro será sede da Cúpula dos Povos, evento paralelo à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a  Rio+20. Contrariamente à Rio 92, Conferência internacional que foi um sucesso - universalizou o tema do desenvolvimento sustentável, aprovou a Agenda 21, as Convenções da Biodiversidade, das Mudanças Climáticas e da Desertificação -, não há muita expectativa em relação à Rio+20.

Por um lado, o Brasil, país que sedia a Conferência, acaba de aprovar um Código Florestal que significa uma licença para o desmatamento e tem como carro-chefe de seu principal programa, o PAC – Programa de Aceleração do Crescimento -, a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, que está expulsando de suas terras vários povos indígenas e ribeirinhos, desmatando parte da floresta e tomando um pedaço do rio Xingu. Esta é apenas a maior de uma série de usinas projetadas para os rios da Amazônia, com grave impacto socioambiental. O governo, além disso, contrariamente à iniciativa de outros países como a China, a Alemanha, a Dinamarca, desconsidera energias renováveis como a solar e a eólica (ventos), investindo pouquíssimo neste setor, embora seja um país tropical, banhado pelo sol o ano inteiro.

Por outro lado, as Conferências da ONU sobre Mudanças Climáticas mais recentes, de Copenhague (2010), Cancún (2011) e Durban (2012), representaram avanços muito tímidos com relação à grave crise ambiental que estamos vivendo. Há um enorme descompasso entre a consciência da humanidade, alertada por relatórios científicos cada vez mais alarmantes, e as medidas adotadas pela comunidade internacional. Esta consciência cresceu com a sucessão de acontecimentos extremos que os países têm sofrido – chuvas devastadoras, inundações, furacões, tornados, tsunamis – além da progressão constante da degradação das terras para a agricultura, da desertificação, da interrupção do fluxo de inúmeros grandes rios em algumas épocas do ano.

O texto-base da Rio+20, o “esboço zero” publicado em janeiro deste ano e já revisto nas negociações da ONU, não faz qualquer menção às causas da degradação ambiental a que estamos assistindo. Uma destas causas é a matriz energética dominante, baseada nos combustíveis fósseis – petróleo, gás, carvão. Não há referência à necessidade de transição para as energias renováveis - eólica, solar, geotérmica, oceânica e outras. Não há referência ao modelo de desenvolvimento responsável pela destruição de recursos naturais numa escala sem precedentes na história da humanidade, o modelo produtivista-consumista.

E a solução apontada é a “economia verde”, que não é claramente definida, mas que aponta para os “instrumentos de mercado”, para a ampliação do “livre comércio”, apela para o mundo dos negócios, atribui às grandes empresas papel fundamental nesta mudança e confia no FMI (Fundo Monetário Internacional), no Banco Mundial, na OMC (Organização Mundial do Comércio) - instituições internacionais que foram grandemente responsáveis pela crise econômica e ambiental em que nos encontramos.

O diagnóstico embutido nesta proposta é que a humanidade não respeita a natureza porque não atribui valor (preço) aos bens e aos serviços ambientais prestados por ela. Sendo assim, é necessário introduzir estes bens e serviços no mercado e possibilitar que eles sejam pagos – por empresas – para serem preservados. É assim que surgiu o “mercado de carbono” e os vários instrumentos derivados desta concepção, entre os quais o REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação florestal) e o PSA (Pagamento por Serviços Ambientais). Em outras palavras, a solução para o desastre em que nos encontramos, produzido pela economia de mercado, é “mais mercado”.

Esta é a razão pela qual movimentos sociais e organizações da sociedade civil de todo o mundo vão realizar, paralelamente à Rio+20, a Cúpula dos Povos. O objetivo deste evento é, em primeiro lugar, fazer a crítica das falsas soluções propostas para o enfrentamento da crise, entre as quais a “economia verde”.

Conhecemos as causas estruturais do problema e sabemos que, para reverter o processo, é fundamental mudar o modelo de desenvolvimento dominante, voltado para o crescimento econômico. Não podemos ficar produzindo e consumindo incessantemente, como se nossos recursos naturais fossem ilimitados, como se a Terra não fosse finita.

Em segundo lugar, mostrar que existem meios para enfrentar a situação atual. Desenvolvimento não é sinônimo de crescimento econômico, de produtivismo-consumismo: desenvolvimento é desdobrar as potencialidades existentes nas pessoas e nas sociedades para que todos possam viver bem. Temos de produzir aquilo de que precisamos, não o que o “mercado” quer que consumamos.

É possível interromper o processo destruidor e as soluções não são apenas teóricas: hoje em dia, em vários lugares do mundo e do nosso país, estão sendo praticadas formas sustentáveis de vida, que geram alimentos saudáveis, sem agrotóxicos, sem transgênicos. Existem fontes de energia que não prejudicam seres humanos nem a natureza em geral e elas são suficientes para aquilo de que necessitamos. O que falta é generalizar estas experiências, que elas se tornem políticas públicas, de modo que não falte água para ninguém, não falte alimentos, não falte trabalho.

Não estamos diante de um cenário inevitável: há soluções, elas existem. O que é necessário é abandonar as concepções e as práticas depredadoras, assumir uma concepção de desenvolvimento centrada na vida e eleger como política prioritária as soluções que vêm sendo apontadas pelos povos.

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